domingo, 20 de maio de 2012

TEMA III - "OS SISTEMAS DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO PARA A EUROPA DO CONHECIMENTO"


O final do segundo milénio é marcado pela preocupação europeia em desbravar caminhos, acertar a marcha e marcar o andamento, no sentido de responder, com o sucesso necessário, ao signo da nova sociedade globalizada que pende entre o Conhecimento e a Conceptualização.
Do conselho Europeu de Lisboa, realizado em Março de 2000, emergiu a “Estratégia de Lisboa” - um conjunto de medidas destinadas a responder ao objectivo estratégico de “tornar a União Europeia  no espaço económico mais dinâmico e competitivo do mundo, baseado no conhecimento e capaz de garantir um crescimento económico sustentável com mais e melhores empregos e maior coesão social”[1]. A aceleração do processo de reforma estrutural visando o fomento da competitividade e da inovação, e a modernização do modelo social europeu orientado para investimento nas pessoas e para o combate à exclusão social, contavam-se entre as medidas a desenvolver, assim como “um programa estimulante para modernizar os sistemas (…) de ensino” (Clímaco, 2005, p.9).
  A educação e a formação, cedo foram consideradas aliadas determinantes do crescimento e do emprego almejados para a Europa, na Agenda de Lisboa. O Conselho Europeu de Estocolmo (Março de 2001) considera a educação “uma fonte de enriquecimento pessoal, mas também um contributo para a coesão social, para a inclusão social e para a solução dos problemas do trabalho e do emprego. (…) As questões do ensino e da educação são constantemente apresentadas como profundamente ligadas à qualidade de vida, sobretudo das jovens gerações. (…) Foram estabelecidos três objectivos estratégicos (…): Aumentar a qualidade e a eficácia dos sistemas de educação e de formação da União Europeia; Facilitar o acesso a todos os sistemas de educação e de formação; Abrir ao mundo exterior os sistemas de educação e de formação” (Clímaco, 2005, pp. 9-10). A trilogia educação-investigação-inovação é reforçada no Relatório Intercalar de 2010, do Conselho e da Comissão Europeia, quando afirma que “criar um ´triângulo do conhecimento` de educação, investigação e inovação e auxiliar todos os cidadãos a melhorarem as suas competências são acções cruciais para o crescimento e o emprego, bem como para a equidade e a inclusão social”[2].
A recessão económica, instalada na Europa, no início do terceiro milénio, “evidencia ainda mais a necessidade de abraçar estes desafios de longo prazo. Os orçamentos públicos e privados estão sob pressão, os postos de trabalho estão a desaparecer e os novos empregos requerem novas competências, de nível mais elevado. (…) (Há) que tornar os sistemas educativos mais abertos e adaptados às necessidades dos cidadãos, do mercado de trabalho e da sociedade em geral”[3]. “As características de inventabilidade, empatia, bom humor e busca do propósito da vida – serão cada vez mais importantes para determinar o êxito ou o fracasso de alguém. Quer se trate de indivíduos singulares, famílias ou organizações, o sucesso profissional e a realização pessoal exigem, agora, uma inteligência completamente nova” (Pink, D.H., p.15).
“A educação ocupa cada vez mais espaço na vida das pessoas à medida que aumenta o papel que desempenha na dinâmica das sociedades modernas. (…) Hoje em dia, ninguém pode pensar em adquirir, na juventude, uma bagagem inicial de conhecimentos que lhe baste para toda a vida, porque a evolução rápida do mundo exige uma actualização contínua dos saberes” (Delors et al, 1997, p.103).
No século XXI tem-se assistido a um grande esforço de cooperação europeia, no âmbito da educação e da formação, marcado pelo “apoio valioso às reformas educativas nacionais e (…) (pelo impulso da) mobilidade de educandos e profissionais do sector em toda e Europa”.[4]
A decisão 2006/1720/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Novembro de 2006, estabelece o “Programa de Aprendizagem ao Longo da Vida” com o objectivo geral de “contribuir (…) para o desenvolvimento da Comunidade enquanto sociedade avançada baseada no conhecimento, caracterizada por um crescimento económico sustentável com mais e melhores empregos e uma maior coesão social, assegurando ao mesmo tempo a protecção adequada do ambiente para as gerações futuras”[5].
Nasce, assim, o Quadro de Referência Europeu onde são definidas, pela primeira vez, as competências essenciais “de que os cidadãos necessitam para a sua realização pessoal, a inclusão social, a cidadania ativa e a empregabilidade na nossa sociedade baseada no conhecimento”[6]. Neste documento - referência a pôr em prática, tanto na formação inicial, como na formação ao longo da vida, são identificadas e definidas as oito competências essenciais necessárias a todos os cidadãos europeus: i) Comunicação na língua materna; ii) Comunicação em línguas estrangeiras; iii) Competência matemática e competências básicas em ciências e tecnologia, iv) Competência digital; v) Aprender a aprender, vi) Competências sociais e cívicas; vii) Espírito de iniciativa e espírito empresarial; viii) Sensibilidade e expressão culturais. “Possuir as competências básicas fundamentais da língua, da literacia, da numeracia e das tecnologias da informação e da comunicação (TIC) é uma condição essencial para aprender, e aprender a aprender está na base de todas as actividades de aprendizagem. (…) Pensamento crítico, criatividade, espírito de iniciativa, resolução de problemas, avaliação de riscos, tomada de decisões e gestão construtiva dos sentimentos são elementos importantes nas oito competências essenciais”[7]. É desta forma que a União Europeia se prepara para responder à “dura obrigação” (Delors et al, 1997, p.89) que cabe à educação no século XXI, a de “fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo complexo e constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que permita navegar através dele” (Delors et al. 1997, p.89).
As competências das pessoas contribuem igualmente para a sua motivação e satisfação profissional, o que se repercute na qualidade do seu trabalho. (…) Precisamos de novas competências para dominar todo um novo mundo digital, não apenas mediante a aquisição de competências técnicas, mas igualmente mediante uma compreensão mais profunda das oportunidades, dos desafios e até das questões éticas resultantes das novas tecnologias. (…) Há um risco de muitos europeus se sentirem abandonados e marginalizados pela globalização e pela revolução digital. (…) Os conhecimentos, as competências e as aptidões necessários a todos têm de evoluir em conformidade” (Competências Essenciais para a Aprendizagem ao longo da vida - Quadro de Referência Europeu. p.1).
 “O ensino e a formação devem apoiar o desenvolvimento destas competências essenciais a um nível que prepare todos os jovens (…) para a aprendizagem futura e para a vida profissional. A educação e a formação de adultos devem propiciar a todos (...) oportunidades reais de desenvolvimento e actualização das suas competências essenciais ao longo da vida”[8].
“Partindo (…) das múltiplas competências individuais, as diferentes necessidades dos aprendentes deverão ser satisfeitas através da garantia da equidade e do acesso de todos os grupos que, devido às desvantagens educacionais decorrentes de circunstâncias pessoais, sociais, culturais ou económicas, careçam de um apoio particular para realizarem o seu potencial educativo” (Competências Essenciais para a Aprendizagem ao longo da vida - Quadro de Referência Europeu - p.3).
“É indispensável que se reforcem os investimentos em áreas específicas da educação e formação, tanto ao nível nacional como europeu, para sair da crise económica, quer como parte das reformas estruturais de longo prazo, quer para atenuar as suas repercussões sociais imediatas. Mais do que nunca, o sucesso da Europa na concorrência mundial depende das suas competências e capacidades de inovação. (…) Deve ser reforçado o papel da educação e formação que sustenta o triângulo do conhecimento. A inovação e o crescimento continuarão a ser insuficientes se não existir uma ampla base de conhecimentos, aptidões e competências que promova o talento e a criatividade desde tenra idade e seja actualizada ao longo da vida adulta. A aprendizagem ao longo da vida e a mobilidade propiciadas por um ensino e uma formação de elevada qualidade são essenciais para dar a todos a possibilidade de adquirir as competências necessárias não só para o mercado do trabalho como também para a inclusão social e a cidadania activa”[9].
A importância atribuída ao ensino e à formação como principal forma de preparação dos cidadãos, no que diz respeito ao desenvolvimento de competências, de capacidades, aptidões e atitudes, perante o trabalho e na própria existência individual, é fulcral e recorrente em todas as reavaliações estratégicas, feitas pela União Europeia até ao presente, e nas estratégias traçadas para o futuro, conforme pode ser apreciado nas conclusões do Conselho sobre o papel do ensino e da formação na implementação da Estratégia Europa 2020, que não hesita em considerar que “o ensino e a formação têm um papel fundamental a desempenhar na consecução dos (seus) objectivos (…) para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo”[10]. Deste modo, considera que “é urgente investir eficazmente na qualidade, na modernização e na reforma do ensino e da formação; (…) é essencial reforçar as oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos e a todos os níveis de ensino e formação; (…) (é necessário) melhorar a capacidade de adaptação dos sistemas de ensino e formação às novas tendências e solicitações, por forma a dar uma melhor resposta às necessidades do mercado de trabalho e aos desafios sociais e culturais de que é palco o nosso mundo globalizado”[11].
Isto porque, “ no futuro que se avizinha, prosperarão os indivíduos e as organizações que concentrarem os seus esforços em fazer o que não pode ser feito por menos dinheiro no estrangeiro ou executado mais rapidamente por um computador, assim como produzir algo que vá de encontro às aspirações estéticas, emocionais e espirituais da nossa sociedade da abundância.” (Pink, 2006, p.261).
         Vislumbrados os horizontes, traçados os caminhos, projetadas as metas a alcançar, terá a Europa as condições económicas, mas sobretudo a ousadia política necessária para os implementar?

Referências bibliográficas:

 Climaco, M.C. (2005). Avaliação de Sistemas em Educação. Lisboa. Universidade Aberta.

Delors, J.; Al- Mufti, I; Amagi, I; Carneiro, R.; Chung, F; Geremek, B; et al. (1997). Educação – Um Tesouro a Descobrir - Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI. Brasil. Edições ASA/Cortez.

      Jornal Oficial da União Europeia (24.11.2006).Decisão 2006/1720/CE do parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Novembro de 2006 que estabelece um programa de acção no domínio da aprendizagem ao longo da vida. Pp: L 327/45 - L327/63. Estrasburgo.  Recuperado em  10/05/2012 de http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2006:327:0045:0068:PT:PDF.

     Jornal Oficial da União europeia (30.12.2006). RECOMENDAÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 18 de Dezembro de 2006 sobre as competências essências para a aprendizagem ao longo da vida. L 394/10 –L 394/18. Bruxelas. Recuperado em 10/ 05/ 2012 de http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2006:394:0010:00.

      Jornal Oficial da União Europeia (6.5.2010). Relatório intercalar conjunto de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do programa de trabalho “ Educação e Formação para 2010. In: Informações Oriundas das Instituições, Órgãos e Organismos da união Europeia. pp: C117/1-C117/7. Comissão Europeia. Recuperado em 18/05/2012 de http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2010:117:FULL:PT:PDF.

      Jornal Oficial da União Europeia (4.3.2011). Conclusões do Conselho sobre o papel do ensino e da formação na implementação da Estratégia Europa 2020. In: Informações Oriundas das Instituições, Órgãos e Organismos da União Europeia. C 70/1-C 70/3. Recuperado em 18/05/2012 de http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2011:070:0001:0003:PT:PDF.

         Pink, Daniel H. (2009). A NOVA INTELIGÊNCIA. Alfragide. Academia do Livro.

     Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) 2007-2013. Estratégia de Lisboa. Recuperado em 18/05/ 2012, de http://www.qren.pt/item3.php?lang=0&id_channel=34&id_page=303

        Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias (2007). Competências Essenciais para a Aprendizagem ao Longo da Vida Quadro de Referência Europeu. Luxemburgo. Recuperado em 01/05/2012, de (http://www.moodle.univ-ab.pt/moodle/mod/resource/view.php?id=1165961).



[1] QREN 2007-2013. Estratégia de Lisboa.
[2]Relatório intercalar de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do programa de trabalho “Educação e Formação para 2010”. Jornal Oficial da União Europeia, C 117/1.
[3] Relatório intercalar de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do programa de trabalho “Educação e Formação para 2010”. Jornal Oficial da União Europeia, C 117/1.
[4] Idem.
[5] Decisão 2006/1720/CE do parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Novembro de 2006. Jornal Oficial da União Europeia, L 327/48.
[6] Competências essenciais para a aprendizagem ao longo da vida - Quadro de Referência Europeu.p.1.
[7] Competências essenciais para a aprendizagem ao longo da vida - Quadro de Referência Europeu - p.3.
[8] Relatório intercalar de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do programa de trabalho “Educação e Formação para 2010”. Jornal Oficial da União Europeia. C117/2.
[9] Relatório Intercalar de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do programa de trabalho “ Educação e Formação para 2010”.Jornal Oficial da União Europeia C117/7.
[10] Informações Oriundas das Instituições, Órgãos e Organismos da União Europeia. Jornal Oficial da União Europeia, 4.3.2011, C70/2).
[11] Idem.

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