O final do segundo milénio é marcado pela preocupação europeia em desbravar
caminhos, acertar a marcha e marcar o andamento, no sentido de responder, com o
sucesso necessário, ao signo da nova sociedade globalizada que pende entre o Conhecimento
e a Conceptualização.
Do conselho Europeu de Lisboa, realizado em Março de 2000, emergiu a “Estratégia de Lisboa” - um conjunto de medidas destinadas a
responder ao objectivo estratégico de “tornar a União Europeia no espaço
económico mais dinâmico e competitivo do mundo, baseado no conhecimento e capaz
de garantir um crescimento económico sustentável com mais e melhores empregos e
maior coesão social”[1]. A
aceleração do processo de reforma estrutural visando o fomento da competitividade
e da inovação, e a modernização do modelo social europeu orientado para
investimento nas pessoas e para o combate à exclusão social, contavam-se entre
as medidas a desenvolver, assim como “um programa estimulante para modernizar
os sistemas (…) de ensino” (Clímaco, 2005, p.9).
A educação e a formação, cedo foram
consideradas aliadas determinantes do crescimento e do emprego almejados para a
Europa, na Agenda de Lisboa. O Conselho Europeu de Estocolmo (Março de 2001) considera
a educação “uma fonte de enriquecimento pessoal, mas também um contributo para
a coesão social, para a inclusão social e para a solução dos problemas do
trabalho e do emprego. (…) As questões do ensino e da educação são
constantemente apresentadas como profundamente ligadas à qualidade de vida,
sobretudo das jovens gerações. (…) Foram estabelecidos três objectivos estratégicos
(…): Aumentar a qualidade e a eficácia dos sistemas de educação e de formação
da União Europeia; Facilitar o acesso a todos os sistemas de educação e de
formação; Abrir ao mundo exterior os sistemas de educação e de formação”
(Clímaco, 2005, pp. 9-10). A trilogia educação-investigação-inovação é
reforçada no Relatório Intercalar de 2010, do Conselho e da Comissão Europeia, quando
afirma que “criar um ´triângulo do conhecimento` de educação, investigação e
inovação e auxiliar todos os cidadãos a melhorarem as suas competências são acções
cruciais para o crescimento e o emprego, bem como para a equidade e a inclusão
social”[2].
A recessão económica, instalada na Europa, no início
do terceiro milénio, “evidencia ainda mais a necessidade de abraçar estes
desafios de longo prazo. Os orçamentos públicos e privados estão sob pressão,
os postos de trabalho estão a desaparecer e os novos empregos requerem novas
competências, de nível mais elevado. (…) (Há) que tornar os sistemas educativos
mais abertos e adaptados às necessidades dos cidadãos, do mercado de trabalho e
da sociedade em geral”[3]. “As
características de inventabilidade, empatia, bom humor e busca do propósito da
vida – serão cada vez mais importantes para determinar o êxito ou o fracasso de
alguém. Quer se trate de indivíduos singulares, famílias ou organizações, o
sucesso profissional e a realização pessoal exigem, agora, uma inteligência completamente
nova” (Pink, D.H., p.15).
“A educação ocupa cada vez mais espaço na vida das
pessoas à medida que aumenta o papel que desempenha na dinâmica das sociedades
modernas. (…) Hoje em dia, ninguém pode pensar em adquirir, na juventude, uma
bagagem inicial de conhecimentos que lhe baste para toda a vida, porque a
evolução rápida do mundo exige uma actualização contínua dos saberes” (Delors
et al, 1997, p.103).
No século XXI tem-se assistido a um grande esforço
de cooperação europeia, no âmbito da educação e da formação, marcado pelo “apoio
valioso às reformas educativas nacionais e (…) (pelo impulso da) mobilidade de
educandos e profissionais do sector em toda e Europa”.[4]
A decisão 2006/1720/CE do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 15 de Novembro de 2006, estabelece o “Programa
de Aprendizagem ao Longo da Vida” com o objectivo geral de “contribuir (…) para
o desenvolvimento da Comunidade enquanto sociedade avançada baseada no
conhecimento, caracterizada por um crescimento económico sustentável com mais e
melhores empregos e uma maior coesão social, assegurando ao mesmo tempo a protecção
adequada do ambiente para as gerações futuras”[5].
Nasce, assim, o Quadro de Referência Europeu
onde são definidas, pela primeira vez, as competências essenciais “de que os
cidadãos necessitam para a sua realização pessoal, a inclusão social, a
cidadania ativa e a empregabilidade na nossa sociedade baseada no conhecimento”[6]. Neste
documento - referência a pôr em prática, tanto na formação inicial, como na
formação ao longo da vida, são identificadas e definidas as oito competências
essenciais necessárias a todos os cidadãos europeus: i) Comunicação na língua
materna; ii) Comunicação em línguas estrangeiras; iii) Competência matemática e
competências básicas em ciências e tecnologia, iv) Competência digital; v)
Aprender a aprender, vi) Competências sociais e cívicas; vii) Espírito de iniciativa
e espírito empresarial; viii) Sensibilidade e expressão culturais. “Possuir as
competências básicas fundamentais da língua, da literacia, da numeracia e das
tecnologias da informação e da comunicação (TIC) é uma condição essencial para aprender,
e aprender a aprender está na base de todas as actividades de aprendizagem. (…)
Pensamento crítico, criatividade, espírito de iniciativa, resolução de
problemas, avaliação de riscos, tomada de decisões e gestão construtiva dos
sentimentos são elementos importantes nas oito competências essenciais”[7]. É
desta forma que a União Europeia se prepara para responder à “dura obrigação”
(Delors et al, 1997, p.89) que cabe à educação no século XXI, a de “fornecer,
de algum modo, os mapas de um mundo complexo e constantemente agitado e, ao
mesmo tempo, a bússola que permita navegar através dele” (Delors et al. 1997, p.89).
As competências das pessoas contribuem
igualmente para a sua motivação e satisfação profissional, o que se repercute
na qualidade do seu trabalho. (…) Precisamos de novas competências para dominar
todo um novo mundo digital, não apenas mediante a aquisição de competências
técnicas, mas igualmente mediante uma compreensão mais profunda das
oportunidades, dos desafios e até das questões éticas resultantes das novas
tecnologias. (…) Há um risco de muitos europeus se sentirem abandonados e
marginalizados pela globalização e pela revolução digital. (…) Os conhecimentos,
as competências e as aptidões necessários a todos têm de evoluir em
conformidade” (Competências Essenciais para a Aprendizagem ao longo da vida - Quadro
de Referência Europeu. p.1).
“O
ensino e a formação devem apoiar o desenvolvimento destas competências
essenciais a um nível que prepare todos os jovens (…) para a aprendizagem futura
e para a vida profissional. A educação e a formação de adultos devem propiciar
a todos (...) oportunidades reais de desenvolvimento e actualização das
suas competências essenciais ao longo da vida”[8].
“Partindo (…) das múltiplas competências
individuais, as diferentes necessidades dos aprendentes deverão ser satisfeitas
através da garantia da equidade e do acesso de todos os grupos que, devido às
desvantagens educacionais decorrentes de circunstâncias pessoais, sociais, culturais
ou económicas, careçam de um apoio particular para realizarem o seu potencial
educativo” (Competências Essenciais para a Aprendizagem ao longo da vida - Quadro
de Referência Europeu - p.3).
“É indispensável que se
reforcem os investimentos em áreas específicas da educação e formação, tanto ao
nível nacional como europeu, para sair da crise económica, quer como parte das reformas
estruturais de longo prazo, quer para atenuar as suas repercussões sociais
imediatas. Mais do que nunca, o sucesso da Europa na concorrência mundial depende
das suas competências e capacidades de inovação. (…) Deve ser reforçado o papel
da educação e formação que sustenta o triângulo do conhecimento. A inovação e o
crescimento continuarão a ser insuficientes se não existir uma ampla base de conhecimentos,
aptidões e competências que promova o talento e a criatividade desde tenra
idade e seja actualizada ao longo da vida adulta. A aprendizagem ao longo da vida
e a mobilidade propiciadas por um ensino e uma formação de elevada qualidade
são essenciais para dar a todos a possibilidade de adquirir as competências
necessárias não só para o mercado do trabalho como também para a inclusão
social e a cidadania activa”[9].
A importância atribuída
ao ensino e à formação como principal forma de preparação dos cidadãos, no que
diz respeito ao desenvolvimento de competências, de capacidades, aptidões e atitudes,
perante o trabalho e na própria existência individual, é fulcral e recorrente
em todas as reavaliações estratégicas, feitas pela União Europeia até ao
presente, e nas estratégias traçadas para o futuro, conforme pode ser apreciado
nas conclusões do Conselho sobre o papel do ensino e da formação na
implementação da Estratégia Europa 2020, que não hesita em considerar que “o ensino
e a formação têm um papel fundamental a desempenhar na consecução dos (seus) objectivos
(…) para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo”[10]. Deste
modo, considera que “é urgente investir eficazmente na qualidade, na
modernização e na reforma do ensino e da formação; (…) é essencial reforçar as
oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos e a todos os níveis
de ensino e formação; (…) (é necessário) melhorar a capacidade de adaptação dos
sistemas de ensino e formação às novas tendências e solicitações, por forma a
dar uma melhor resposta às necessidades do mercado de trabalho e aos desafios
sociais e culturais de que é palco o nosso mundo globalizado”[11].
Isto porque, “ no
futuro que se avizinha, prosperarão os indivíduos e as organizações que
concentrarem os seus esforços em fazer o que não pode ser feito por menos
dinheiro no estrangeiro ou executado mais rapidamente por um computador, assim
como produzir algo que vá de encontro às aspirações estéticas, emocionais e
espirituais da nossa sociedade da abundância.” (Pink, 2006, p.261).
Vislumbrados os horizontes, traçados os caminhos, projetadas as metas a alcançar, terá a Europa as condições económicas, mas sobretudo a ousadia política necessária para os implementar?
Vislumbrados os horizontes, traçados os caminhos, projetadas as metas a alcançar, terá a Europa as condições económicas, mas sobretudo a ousadia política necessária para os implementar?
Referências bibliográficas:
Climaco, M.C. (2005). Avaliação de Sistemas em Educação. Lisboa. Universidade Aberta.
Jornal Oficial da União Europeia
(24.11.2006).Decisão 2006/1720/CE do parlamento Europeu e do Conselho de
15 de Novembro de 2006 que estabelece um programa de acção no domínio da
aprendizagem ao longo da vida. Pp: L 327/45 - L327/63. Estrasburgo. Recuperado em 10/05/2012 de http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2006:327:0045:0068:PT:PDF.
Jornal Oficial da União europeia
(30.12.2006). RECOMENDAÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de
18 de Dezembro de 2006 sobre as competências essências para a aprendizagem ao
longo da vida. L 394/10 –L 394/18. Bruxelas. Recuperado em 10/ 05/ 2012 de http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2006:394:0010:00.
Jornal Oficial da União Europeia
(6.5.2010). Relatório intercalar conjunto de 2010 do Conselho e da
Comissão Europeia sobre a aplicação do programa de trabalho “ Educação e
Formação para 2010”. In: Informações Oriundas das Instituições, Órgãos e
Organismos da união Europeia. pp: C117/1-C117/7. Comissão Europeia. Recuperado
em 18/05/2012 de http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2010:117:FULL:PT:PDF.
Jornal Oficial da União Europeia
(4.3.2011). Conclusões do Conselho sobre o papel do ensino e da formação
na implementação da Estratégia Europa 2020. In: Informações Oriundas das
Instituições, Órgãos e Organismos da União Europeia. C 70/1-C 70/3. Recuperado
em 18/05/2012 de http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2011:070:0001:0003:PT:PDF.
Pink, Daniel H. (2009). A NOVA
INTELIGÊNCIA. Alfragide. Academia do Livro.
Quadro de Referência Estratégico
Nacional (QREN) 2007-2013. Estratégia de Lisboa. Recuperado em
18/05/ 2012, de http://www.qren.pt/item3.php?lang=0&id_channel=34&id_page=303
Serviço das Publicações Oficiais das
Comunidades Europeias (2007). Competências Essenciais para a Aprendizagem ao
Longo da Vida – Quadro de Referência Europeu. Luxemburgo.
Recuperado em 01/05/2012, de
(http://www.moodle.univ-ab.pt/moodle/mod/resource/view.php?id=1165961).
[1]
QREN 2007-2013. Estratégia de Lisboa.
[2]Relatório
intercalar de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do
programa de trabalho “Educação e Formação para 2010”. Jornal Oficial da
União Europeia, C 117/1.
[3]
Relatório
intercalar de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do
programa de trabalho “Educação e Formação para 2010”. Jornal Oficial da
União Europeia, C 117/1.
[4]
Idem.
[5]
Decisão
2006/1720/CE do parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Novembro de 2006.
Jornal Oficial da União Europeia, L 327/48.
[6]
Competências essenciais para a aprendizagem ao longo da vida - Quadro
de Referência Europeu.p.1.
[7] Competências
essenciais para a aprendizagem ao longo da vida - Quadro de Referência Europeu
- p.3.
[8] Relatório
intercalar de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do
programa de trabalho “Educação e Formação para 2010”. Jornal Oficial da
União Europeia. C117/2.
[9] Relatório
Intercalar de 2010 do Conselho e da Comissão Europeia sobre a aplicação do
programa de trabalho “ Educação e Formação para 2010”.Jornal Oficial da
União Europeia C117/7.
[10] Informações
Oriundas das Instituições, Órgãos e Organismos da União Europeia. Jornal
Oficial da União Europeia, 4.3.2011, C70/2).
[11] Idem.
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